“- Por que eu tenho que ser tão feio, mamãe? – murmurei.
- Não, querido, você não é...
- Eu sei que sou.
Ela beijou meu rosto todo. Beijou
meus olhos que eram muito caídos. Beijou minhas bochechas, que pareciam
afundadas demais. Beijou minha boca de tartaruga.
Disse palavras gentis, que, eu
sabia, eram para me ajudar, mas palavras não vão mudar meu rosto.”
É claro que eu já sofri bullyng. Olhe para mim, meu
cabelo é cacheado e não é fácil de cuidar. Quando acordo, digamos que: ele
se apropria de uma rebeldia incontrolável. Demorei muito para conseguir
entender que “pau que nasce torto nunca se endireita, rs”. Hoje, minhas intrigas com meu cabelo são bem menos frequentes e agora nos amamos, mutuamente.
Na minha infância, alguns amigos da escolinha onde eu frequentava me chamavam
de “sapatão”, só porque eu usava, dia e noite , um all star com salto plataforma cheio de glitter que ganhei dos
meus pais de aniversário. Sim, sei que era muito brega, mas eu era uma
criança de sete anos e usar acessórios com glitter era muito descolado (na
minha cabeça). Sem mencionar meu lance com botas de bico fino e shorts, que gostava
de colocar na boca do estômago para apertar a barriga e parecer mais magrinha.
Porque SIM, eu também era gorda.
Acontece que eu não me achava
feia, na real, me achava linda! Adorava meu cabelo, mesmo sabendo que nunca
sentiria o vento a esvoaçá-lo. Tipo aquele fenômeno que a
gente vê nos comercias de shampoo. Enfim, muitas outras peculiaridades que eu
possuía eram motivo para que os meus “amiguinhos” zombassem de mim. Se não fossem aqueles patifes, usaria até
hoje meu super all star. Brincadeira, também não vou avacalhar ...
Certo vez, cheguei em casa depois
de um dia na pré-escola, olhei pra minha mãe e disse:
- Mãe, não quero mais usar esse
tênis na escola porque meus amigos estão me chamando de “sapatão”.
- Então eles não são teus amigos.
- Mas mãe, ele também está
apertado. Preciso de um novo – enfatizei.
- Está bem... Vamos comprar outro em breve. Ah, não ligue para o que falam de você! Eles devem estar com
inveja porque você fica mais alta que eles – respondeu, sem parecer dar muita importância para o meu problema.
Na verdade, eu não sabia o que
significava o termo pejorativo “sapatão” e ela percebeu isso, contudo, não se
preocupou em me dar explicações naquele momento. Seu coração de mãe estava mais
preocupado em me moldar como ser humano, fazendo-me encarar os problemas que
teria em ser quem eu era. Dias depois ela comprou outro tênis e,
adivinhem, também tinha salto plataforma! Tive que usá-lo até a sola
gastar e olha que isso não foi uma tarefa fácil... Somente anos mais tarde entendi
que a minha preciosa mãe estava me ensinando três grandes lições para a vida toda: não ligue para o que
pensam ou falam de você; aprenda a lidar com suas características ou gostos
diferenciados, mesmo que ninguém se agrade; quem te ama, te aceita exatamente
como você é. Acho que não preciso falar
mais nada...
Tudo isso que contei foi apenas
para reforçar a problemática abordada no livro “Extraordinário”, de R. J.
Palácio. A obra conta a história de um garoto chamado August Pullman, mais
conhecido como Auggie. Ele nasceu com uma deformidade facial, deixando-o
com uma aparência um tanto assustadora. Aos dez anos, Auggie nunca havia
frequentando uma escola comum, mas quando esse dia finalmente chega, ele
precisa aprender a sobreviver num mundo onde existe bullyng. Da perspectiva dos pais, da irmã, dos amigos e do próprio
Auggie, os relatos são contados com uma sensibilidade comovente. O maior desafio
dele era provar para todos sua semelhança com as outras crianças, apesar da aparência. Para
nós, o maior desafio é a gentileza.
Não importa quão bonita ou feia
seja uma pessoa, o fato é que, inevitavelmente, você se acostumará com ela. Mesmo
que as pessoas tentem te diminuir, ofender, usar suas características peculiares contra você mesmo, entenda que “todo o que é nascido de Deus
vence o mundo”. Ser diferente é bom! Não fomos criados para sermos iguais e nem para agradarmos a todos. Além disso, ninguém pode magoá-lo te chamando de "narigudo" sem que você permita. Portanto, não deixe que
comentários maldosos lhe façam mal. No fundo, o que o oprime quer ser um pouco
do que você é.
Preceito de Auggie: “Toda pessoa
deveria ser aplaudida de pé, pelo menos uma vez na vida, porque todos nós vencemos
o mundo.”
Por Jhenifer Costa